segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Falta de educação

Paulo Guedes, de EXAME

Estimativas indicam que o setor educacional brasileiro mobiliza aproximadamente 13,5% de nosso produto interno bruto. Tal volume de recursos supera até mesmo a soma das indústrias de petróleo, energia elétrica e telecomunicações. Melhor para o país. Todos aceitam que, na sociedade do conhecimento, o principal recurso econômico é o capital humano. O conhecimento condiciona não apenas a capacidade de absorção de tecnologia pelas empresas mas também a simples pretensão a empregos e salários razoáveis por parte dos indivíduos.

Ainda que tenha melhorado na matéria, o Brasil está longe de ser aprovado com louvor. A desaceleração do crescimento demográfico, do lado da demanda, e a crescente destinação de verbas para ampliar a rede pública e a expansão da rede privada, do lado da oferta, descomprimiram os gargalos educacionais no ensino fundamental e médio. As pressões de demanda deslocaram-se, assim, para a educação superior, para o ensino técnico profissionalizante e para os cursos de reciclagem e atualização.

O aumento da demanda produziu um crescimento vertiginoso da rede privada de ensino superior e da indústria de treinamento executivo. É sinal claro de ampliação dos investimentos em capital humano. Mas problemas antigos ainda persistem. De um lado, o ensino privado é rentável, mas de baixa qualidade. De outro, o ensino público tem qualidade, mas é elitista e deficitário. É acessível apenas aos filhos das classes média e alta, que são aprovados no vestibular por terem frequentado boas escolas privadas no ensino médio.

Entidades privadas com fins lucrativos escondem-se por trás da fachada de filantropia, evitando contribuições à previdência social e ao imposto de renda. Enquanto isso, as entidades públicas e semipúblicas de prestígio atiram-se ao treinamento executivo, segmento mais rentável do setor educacional, e mergulham em crise de identidade. Seriam centros de excelência destinados a transferir subsídios na forma de ensino superior gratuito a membros de famílias privilegiadas? Ou fábricas de diplomas de treinamento executivo, que cobram dos pais da classe média os subsídios que transferem a seus filhos? Como ampliar as vagas em meio a greve de professores e déficits crescentes?

Tudo isso aponta para a necessidade de repensar o modelo de ensino superior brasileiro. A informalidade sob o manto da filantropia e o déficit público sob o manto da qualidade não podem subsistir. Serão inevitáveis a remoção de isenções previdenciárias e tributárias às empresas fornecedoras e a eliminação de subsídios na forma de educação superior gratuita aos que são capazes de pagar. Privilégios e injustiças se escondem sob os mitos da filantropia privada e da qualidade pública.

As novas tecnologias acenam com a transformação do modelo de transmissão de conhecimento. O setor educacional, altamente fragmentado, deve passar por um processo de consolidação. E o papel primordial do poder público será diferente do de hoje. O governo deverá se concentrar em instrumentos que produzam qualidade no ensino superior (como o Provão do MEC) e igualdade de oportunidades (como o programa Bolsa-Escola para universitários).

Outros requisitos indissociáveis do processo educacional exigem uma bateria de instrumentos: verbas para pesquisa em centros de excelência, bolsas para desfavorecidos, subsídios específicos para especializações intensivas em pesquisa básica em contraposição à pesquisa aplicada (ou seja, matemática, física, mas não administração, engenharia). O país pode ter desempenho educacional mais efetivo, usando menos recursos, se abandonar os dogmas que cercam o modelo atual.

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